Em junho de 68, há 46 anos, era lançado um dos discos mais
inovadores da música brasileira. Estreia oficial de uma icônica banda do
movimento tropicalista. “Os Mutantes”, de Os Mutantes. Mas essa história
começou alguns anos antes, quando os irmãos Baptista, Arnaldo e Cláudio
resolveram montar uma banda com Raphael Vilardi e Roberto Loyola. Cláudio, mas
não é Sergio?! Pois é, resolvi começar do princípio para dar os devidos
créditos ao irmão esquecido, que foi fundamental para toda sonoridade desse
grande álbum. Mudando algumas vezes de nome, saindo Raphael, Roberto e Cláudio,
que ficou atrás dos palcos e já anteriormente com a entrada de Rita Lee e
Sérgio Dias, a banda fechou-se como Mutantes. O nome foi inspirado no livro de
ficção científica “O Império dos Mutantes”. No ano de 66, o grupo musical
ganhou notoriedade primeiramente ao participar de um programa de televisão
exibido pela TV Record, e posteriormente ao participar da gravação de algumas
músicas e festivais ao lado de pessoas como Gilberto Gil e Caetano Veloso, que
trouxeram o tropicalismo para Os Mutantes.
O álbum, apesar de estampar na capa os três mutantes, é um trabalho de
muitos artistas. Com arranjos do maestro Rogério Duprat, um dos principais
responsáveis por moldar a sonoridade da Tropicália, foi possível um disco bem
construído e criativo harmonicamente. O experimentalismo é uma característica
marcante de todo o álbum, que utiliza grandes mudanças de ritmo e objetos não
convencionais para a composição de todo atmosfera sonora. E, entre as músicas
executadas no disco, muitas foram compostas na parceria de Caetano e Gil, mas
há ainda versões de canções de John Phillips, Françoise Hardy, Jorge Ben Jor e outras
originais da banda. O suporte de instrumentos e efeitos teve grande
contribuição do irmão Baptista, Cláudio César Dias Baptista. Sabe aquele som
gritado pela guitarra em Bat Macumba? Foi desenvolvido por ele, em um
pedal que utilizava o motor de uma máquina de costura. Além disso, CCDB, como
assinou posteriormente nas produções e vendas de seus equipamentos musicais,
construiu a famosa guitarra de ouro. Numa época onde não se produziam boas
guitarras brasileiras e a importação era muito inacessível, Cláudio César, a
pedido de Raphael Vilardi, ficou encarregado de construir a melhor guitarra do
mundo. Com certa experiência em construir guitarras, ele então fez todo o
trabalho com duas. Uma como protótipo para fazer os testes, e outra para
aplicar o que tinha dado certo. Com todo material folhado a ouro, entregou a
definitiva para Raphael e fez uns ajustes para presentear seu irmão Sérgio com
a outra, guitarra que o acompanha até hoje. A peculiaridade desse instrumento é
um símbolo tanto sonoro como visual da banda.
Voltando ao disco, ele é iniciado majestosamente com a faixa Panis Et Circenses. A música é uma composição de Caetano Veloso e Gilberto Gil, e tem o título em latim já deixando claro sua crítica ao “Pão e Circo”, política adotada na roma antiga para não deixar o povo insatisfeito com os governantes. Nitidamente, a música faz uma crítica ao governo vigente, no caso a ditadura militar. Fora a letra, elementos sonoros completam a mensagem e enriquecem a canção. A própria introdução é uma referência à abertura do “Repórter Esso”, radiojornal e depois também televisivo, que ficou famoso por ser um dos primeiros noticiários brasileiros. O programa caracterizou-se por pregar os ideais norte-americanos na América Latína, além de ter como patrocinador a “Esso”, marca que no Brasil representava na Standard Oil Company, de nada menos do que John Rockfeller. Mais para o final do disco, se ouve um efeito de que ele está parando de girar, em seguida ouvimos uma família jantando.
A segunda faixa é Minha Menina, música composta por Jorge Ben
Jor, que também participou gravando o violão. Mesmo assim, percebemos toda a
identidade “mutante” presente na música, que traz uma canção única com ritmo
contagiante.

A oitava faixa é Bat Macumba, uma composição também de Caetano
Veloso e Gilberto Gil. A letra da canção forma um poema visual que faz
referência junto com o título entre o Batman e a cultura afro-brasileira, o que
também fica claro na união entre o ritmo candomblé e as misturas sonoras
tecnológicas.
O disco é completado pelas faixas Le Premier Bonheur du Jour, Trem
Fantasma, Tempo no Tempo, todas muito bem exploradas por elementos
sonoplásticos e utilizando da criatividade presente no disco todo. A última
faixa é Aves Gengis Khan, da própria banda. A música consta,
basicamente, de um único tema repetido de maneiras diferentes, recheado de
psicodelia e vozes invertidas para completar a canção. Até o pai dos irmãos
Baptista participa com sua voz no meio da música.
Os Mutantes com certeza são uma das grandes referências mundiais para o
rock psicodélico, tendo esse primeiro disco como um grande marco para a música
brasileira também. E é por isso que em sua lista de admiradores figuram pessoas
como Kurt Cobain, Sean Lennon, Björk, eu e acredito que você também. E se ainda
não conhece, escute!
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